Traumas na infância e TOC




“Tenho TOC, vivo organizando/alinhando as coisas inconscientemente. Isso tem relação com algum trauma de infância?” – B.V. 

Vamos primeiro compreender o que é trauma e partir do princípio de que todo trauma gera consequências na vida de qualquer pessoa.

Sendo assim, trauma é todo evento/situação de caráter estressor que não passa pelo crivo da elaboração. Exemplos: Um relacionamento abusivo, uma situação financeira ruim e uma vida carente, ambientes familiares agressivos e etc.

Quando esses traumas acontecem na infância ou na adolescência, temos um fator agravante, pois o sujeito traumatizado passa a se desenvolver e entender que o ambiente onde vive é inseguro tornando-se reativo a ele. Essa reatividade pode desencadear um estado de hipervigilância que resultará em um quadro de ansiedade.

Francisco Assumpção, médico e professor no departamento de psiquiatria da USP, afirma que, em algumas situações, a ansiedade pode até ser benéfica. "A ansiedade não é um problema por si só. É ela que faz você ir para frente. Quando a intensidade é muito alta ou a frequência é muito grande vira um fator estressor grave.”, disse.

É importante ressaltar que todos sentem ansiedade, o problema é quando ela começa a interferir, paralisar e prejudicar a rotina do dia a dia, relações interpessoais e o desempenho no trabalho ou nos estudos. Quando atinge esse patamar, ela deixa de ser simplesmente ansiedade e passa a ser um transtorno de ansiedade.

Francisco Assumpção nos dá o seguinte exemplo: “Se uma criança faz xixi na roupa, esse fato pode virar um fator estressor, apesar de ser algo simples e facilmente contornável. Isso porque, fazer xixi na roupa tem uma repercussão social. Os amiguinhos podem inventar um apelido, não vai poder viajar com a escola, não vai poder dormir na casa dos amigos. Isso vai fazer com que ela desenvolva uma autoimagem baixa. Porque esse é o momento de desenvolvimento de autoimagem”.

Para aplacar esses sintomas desencadeados pela ansiedade, muitas crianças, adolescentes e adultos, desenvolvem rituais compulsivos (algum comportamento repetitivo, de forma sequencial ou em um determinado número de vezes) que, psicologicamente, diminuem o sentimento de riscos causados pelo ambiente, seja um risco de doença, de morte, de um esporro, ou de maus-tratos.

Esses rituais são paliativos, pois após algum tempo os pensamentos retornam, a ansiedade aumenta e a pessoa necessita repetir os rituais ficando, desta forma, presa a um círculo vicioso. Essas características constituem o que conhecemos como um dos transtornos de ansiedade mais comum: Transtorno Obsessivo Compulsivo (TOC).

Os sintomas do TOC envolvem:
Alterações do comportamento - rituais ou compulsões, repetições e evitações;

Alterações dos pensamentos - preocupações excessivas, dúvidas, pensamentos de conteúdo impróprio ou “ruim” e obsessões;

Alterações das emoções - ansiedade, medo, desconforto, aflição, culpa e depressão.

Segundo o National Institute of Mental Health (NIMH), as causas do TOC ainda são desconhecidas, mas os fatores de riscos incluem genética, estrutura e funcionamento do cérebro e, como vimos, traumas causados pelo meio ambiente ao redor do sujeito.

Sendo assim, quadros de transtorno de ansiedade (TOC entre eles) não se desenvolvem apenas na infância. Muitos possuem raízes nessa fase, mas todo evento traumático pode se tornar uma porta de entrada para algum transtorno.

A boa notícia é que possui tratamento, onde os mais eficazes são o acompanhamento psicológico (psicoterapia) e psiquiátrico.

O acompanhamento psicológico, em especial, busca favorecer ao paciente a elaboração dos traumas e visa minimizar seus impactos na vida adulta. A psicoterapia também auxilia o paciente na identificação de outros estímulos de ansiedade e estresse, reduzindo o estado de ansiedade e fortalecendo a autoimagem e a autoestima.


Este artigo não se caracteriza como fundamentador para autodiagnóstico. Ao identificar sintomas, como os descritos no texto, procure ajuda profissional de um médico ou um psicólogo.


Fontes:

National Institute of Mental Health

Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo

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